sexta-feira, 12 de novembro de 2010

Ponto de Partida

Boa tarde,

Para dar o primeiro passo nesse espaço virtual democratico, estou tranferindo o texto-mails que nosso amigo Helton mandou para as nossas listas, e que foi aprovado por todos os presentes em nossa primeira reunião como uma "ata" perfeita dos acontecimentos.

Caros Colegas

Este texto é a minha "contribuição/reflexão" sobre a reunião acontecida esta semana sobre Mobilidade por Bicicleta, à qual compareci, e que me pareceu altamente positiva e produtiva.

Diria eu que o assunto em questão - o que fazer para aliviar a barra do trânsito em nossa(s) cidade(s), com ou sem bicicleta - é completamente pertinente, e portanto os eventos a ele relacionados são do maior interesse da nossa comunidade ciclística.

Conforme publicado na(s) lista(s) semana passada, houve uma reunião na última quinta-feira, organizada pelo Marcelo Sgarbossa (ex-ciclista profissional, candidato a deputado na última eleição - obviamente não ganhou, pois o foco da campanha dele foi a bicicleta e o transporte), para tratar das políticas públicas que estão sendo "politizadas" pelo Ministério das Cidades, em Brasília. A reunião foi realizada no recém-criado LAPPUS - Laboratório de Políticas Públicas e Sociais - (pelo que eu entendi, um espaço sem vínculos com o governo ou com outras entidades), e contou com a presença do nosso companheiro Raul Sanvicente, que foi a Brasília custeando as próprias despesas, a convite do Sgarbossa, para ver o que andava acontecendo.

O documento resultante da conferência em Brasília, disponível em algum lugar da internet e lido rapidamente pelo Raul Sanvicente, que o imprimiu, consistia em uma lista de ações propostas por vários elementos (cidadãos, entidades, secretarias, etc.) para estimular a mobilidade por bicicleta nas cidades. As ações podem ser vistas no site do Ministério da Cidades.

mas um resumo do que consta ali segue abaixo:


Objetivos:

• Inserir e ampliar o transporte por bicicleta na matriz de deslocamentos urbanos;

• Promover sua integração aos sistemas de transportes coletivos, visando reduzir o custo de deslocamento, principalmente da população de menor renda;

• Estimular os governos municipais a implantar sistemas cicloviários e um conjunto de ações que garantam a segurança de ciclistas nos deslocamentos urbanos;

• Difundir o conceito de mobilidade urbana sustentável, estimulando os meios não motorizados de transporte, inserindo-os no desenho urbano.

Ações previstas:

1 - Capacitação de gestores públicos para a elaboração e implantação de sistemas cicloviários;

2 - Integração da bicicleta no planejamento de sistemas de transportes e equipamentos públicos;

3 - Estímulo à integração das ações das três esferas de Governo;

4 - Sensibilização da sociedade para a efetivação do Programa;

5 - Estímulo ao desenvolvimento tecnológico;

6 - Fomento à implementação de infra-estrutura para o uso da bicicleta.

Instrumentos de Implementação:

1 - Publicação de material informativo e de capacitação;

2 - Realização de Cursos e Seminários nacionais s internacionais;

3 - Edição de normas e diretrizes;

4 - Realização e fomento de pesquisas;

5 - Implantação de banco de dados;

6 - Fomento a implementação Programas Municipais de Mobilidade por Bicicleta;

7 - Criação de novas fontes de financiamento;

8 - Divulgação das Boas Políticas."



Ou seja, tudo muito administrativo, estratégico, indefinido, ao menos por enquanto. Aliás, não surpreende, pois isso é o que a reunião se propôs a ser.

Na verdade, a reunião, ou a apresentação do programa/documento, foi mais um ponto de partida para que o pessoal expusesse seus pontos de vista a respeito dessa temática mais seminal de "O QUE DEVE SER FEITO PARA QUE USAR A BICICLETA NO DIA A DIA DEIXE DE SER O QUE É (um ato de teimosia associado ao risco de vida, ao desconforto e à estranheza por parte de algumas pessoas) E PASSE A SER AQUILO QUE GOSTARÍAMOS QUE FOSSE (algo tão normal e pouco digno de nota quanto é na Holanda ou na Alemanha, por exemplo) ?"

Não é a primeira vez que participo ou ouço falar de debates sobre esse tema, e a experiência (minha e de outros) comprova que, historicamente, esses debates costumam ser palco de discussões apaixonadas (no mau sentido), que com frequência descambam para o bate-boca infrutífero, ou para o exercício de vaidades ou politicagens oportunistas. Na melhor das hipóteses, não foram poucos os casos de iniciativas que não passaram de ótimas intenções, e acabaram sendo sepultadas por falta de continuidade, ou por desânimo, ou por um otimismo exagerado com prazo de validade curto. (confesso: provavelmente eu esteja exagerando, mas a idéia é mais ou menos essa).

Pois admito que fui à reunião com um pé atrás, ainda mais sendo organizada por um político (e isso que eu até votei no cara), mas enfim, a gente tem que conferir e dar crédito e tentar, se possível mais do que cruzar os braços pra depois falar mal de algo do qual nem ao menos temos conhecimento suficiente (quantas vezes já fiz isso...).

O fato é que, na discussão que se seguiu (e que será detalhada a seguir), nada disso aconteceu, muito antes pelo contrário: houve um equilíbrio triunfal entre otimismo e realismo, entre diversidade e respeito à opinião alheia, entre convicção e consciência de que ninguém é dono da verdade, entre ser fiel aos próprios interesses mas saber que o coletivo sempre deve ser o alvo principal dos esforços. Não houve elevação de voz, dedo na cara, falácias e coisas do gênero. Em todos os momentos, predominou a intenção ativa de buscar um consenso, de preferência oriundo de uma visão completa e correta dos componentes do problema que temos a enfrentar.

Creio que um dos principais motivos dessa riqueza ideológica se deva à presença de representantes, "oficiais" ou não, das mais variadas correntes de "pensamento ciclístico" (se é que isso existe). Vou mencionar aqueles que conheço pessoalmente:

- O Lagartixa, da ACZS (Associação Ciclística da Zona Sul), atleta, mecânico, lojista, cicloturista, organizador de passeios, articulador político (na medida do possível), há mais de vinte anos vivendo a bicicleta e vivendo da bicicleta;

- A Ninki, organizadora dos brevets da Sociedade Audax Porto Alegre;

- O Lazzarotto, pedalador de longa data e amante/gourmet ciclístico (agora na onda das fixas);

- O Olavo, pró-bicicleta, levemente anti-carro, adepto do ciclismo familiar (cadeirinhas, reboques, tandems) e muito bem-sucedido reacendedor da Massa Crítica (nos moldes originais) em nossa cidade;

- O Raul Sanvicente, reclineiro audaxioso e outro amante/gourmet ciclístico;

- O Robertinho, mecânico e bicicleteiro desde que o Raul Cortez usava franja, e frequentador assíduo do Gasômetro;

- O Pablo Weiss, membro da cúpula do Poabikers e de uma conhecida loja de bike do Sarandi.

(além desses, havia um advogado de pernambuco amigo do Sgarbossa, um rapaz do Rio que anda de fixa e é absolutamente anti-carro, um rapaz que é sócio de um serviço de entregas-rápidas por bicicleta, uma moça que usa a bicicleta no dia-a-dia e veio pra conhecer o que estava acontecendo, e dois ou três senhores que acho que conheço de vista)

Diria que esses que tiveram os nomes citados foram os que falaram mais (além de mim, é claro, que pra dar meu pitaco não pago imposto). Diria também que, independente das opiniões específicas, percebe-se que há uma tendência para a CONVERGÊNCIA, ou seja, independente se o cara é só audaxioso, ou só vai no passeio noturno, ou pedala em grupo, ou sozinho, rápido, ou devagar, quem usa bicicleta, e ainda mais quem usa a bastante tempo, está começando a perceber que há algumas coisas UNIVERSAIS que estão erradas, e que devem ser resolvidas para melhorar a vida de todo mundo que pedala. Além disso, parece haver um consenso de que o caminho que deveria ser o correto (em um país civilizado, que não é exatamente o caso do nosso), ou seja, esperar que o poder público "faça-alguma-coisa, Mutley", não é o caminho que devemosseguir. 

Ou seja, fica evidente que diante da indiferença operacional e mesmo estratégica de uma boa parcela de "grandes forças ocultas" da nossa sociedade - em especial forças econômicas - cabe à massa de pessoas insatisfeitas tomar providências a fim de mudar alguma coisa, ou algumas coisas.

Vou tentar sintetizar da melhor forma possível (tentando não distorcer) os principais pontos/posturas/opiniões levantados durante o debate, lembrando que nenhum desses é inédito ou de autoria exclusiva da pessoa que o colocou em discussão:

1) Verbas que existem, e que por lei deveriam ser investidas em melhorias de transporte público, incluindo bicicletas, não estão sendo aplicadas: Esse ponto de vista, apresentado e defendido pelo Olavo, ressalta que apenas trinta por cento do número de pessoas que transitam diariamente por, digamos, Porto Alegre, utiliza carro. Assim sendo, um uso DEMOCRÁTICO (ou seja, justo) do dinheiro público deveria destinar apenas trinta por cento da verba de infra-estrutura de transporte para os carros (pontes, viadutos, alargamento de vias, áreas públicas de estacionamento, etc.). O restante deveria ser dedicado a outras formas de transporte individual (pedestres: calçadas, passarelas, faixas de segurança, redutores de velocidade; e ciclistas: ciclovias, bicicletários, integração intermodal) e transporte coletivo (novos ônibus/metrôs, novas linhas, paradas, corredores, manutenção, redução de tarifa). Esse ponto de vista tem como princípio a via política, ou seja, deposita no governo a responsabilidade de execução daquilo que já está regulamentado, e no cidadão a responsabilidade de cobrar, e em caso de inconformidade cobrar mais ainda (abaixo-assinado, passeata).

2) A educação é o ponto mais fundamental, e talvez somente ela possa REALMENTE mudar as coisas de verdade. Esse ponto de vista, desenvolvido pela Ninki, ecoado pelo Raul e defendido em maior ou menor grau por todos os participantes, considera que a meta principal é humanizar o trânsito, ou seja, criar uma consciência onipresente nas cabeças dos condutores de que é a VIDA, ou as milhares de vidas, que estão no trânsito (em trânsito), e que portanto há comportamentos, atualmente abundantes, que são na verdade inaceitáveis, como excesso de velocidade, truculência, alienação, desprezo, imprudência, imperícia, negligência, etc. 

Esse ponto de vista focaliza a atenção não na infra-estrutura de tráfego (vias, sinalização) ou na letra da lei (regras operacionais para a condução dos veículos), mas no COMPORTAMENTO dos motoristas e pedestres, praticamente na postura filosófica dos participantes do trânsito. Evidentemente esse tipo de mudança passa pela educação, seja inclusão de conhecimentos de trânsito no ensino fundamental, na criação de cursos para os motoristas profissionais, na elaboração de um currículo inclusivo para a formação de condutores (que ensine, por exemplo, que bicicletas existem), e na veiculação de campanhas de conscientização na mídia. Esse ponto de vista, apesar de provavelmente ter o maior efeito a longo prazo, poderia demorar demais e exigir um volume muito grande de recursos (financeiros, humanos, logísticos) para agir.

3) O uso de veículos de passeio particulares como principal meio de locomoção de uma considerável parcela da população é um absurdo, por ser energeticamente ineficiente, poluidor, causar milhares de mortes anuais, etc.

Esse ponto de vista, apresentado e defendido pelo rapaz do Rio de Janeiro, representa a visão extensamente discutida no livro Apocalipse Motorizado, e compartilhada por uma razoável parcela de participantes de Massas Críticas ao redor do mundo (e na nossa também, é claro). As grandes massas urbanas, e até as pequenas, estão sendo estranguladas pela primazia absoluta do carro particular, com o apoio dos órgãos públicos comprometidos com um modelo altamente questionável de "progresso e desenvolvimento econômico", que privilegia ricos e encurrala o cidadão pedestre em calçadas cada vez mais estreitas e espaços públicos cada vez mais escassos e inóspitos. A solução do problema, portanto, estaria na criação de medidas altamente desestimulantes, restritivas e até proibitivas para a comercialização e circulação de automóveis particulares. Acontecendo isso, sobraria uma infinidade de espaço por onde poderiam circular pessoas, veículos de transporte coletivo, em uma cidade mais limpa, silenciosa e urbanisticamente saudável, como já aconteceu em diversas cidades de primeiro mundo que servem como prova de que isso é possível. Como objeção (que eu e outros colegas colocaram, mesmo considerando a validade quase integral de toda essa linha de argumentação), devemos considerar que o poder real e comprovado das
forças econômicas, políticas e culturais por trás desse modelo é tão descomunal, que esperar realisticamente que a postura anti-carro seja o "motor" de uma revolução na maneira como as cidades brasileiras convivem com o transporte seria, na melhor das hipóteses, muito ingênuo e certamente infrutífero. Gostaríamos de estar errados.

4) O comportamento dos motoristas (principalmente dos profissionais) no trânsito de Porto Alegre já está tão brutalizado que pedalar "se sentindo parte" do trânsito já pode ser considerado um sério risco de vida, onde o medo, a raiva e a impotência são os sentimentos que ocupam a mente do ciclista a maior parte do tempo, quase eliminando o transporte por bicicletam como algo que se possa recomendar para as pessoas comuns como uma alternativa viável ao carro ou ao ônibus.
Esse ponto de vista, defendido fortemente pelo rapaz do serviço de entregas rápidas, e ecoado em gênero e grau por mim, descreve o trânsito em Porto Alegre, hoje, como uma arena medieval dominada por psicopatas que estão cagando e andando se tem um fdp em cima duma bicicleta trancando o caminho deles. O que importa é acelerar, chegar antes do cara do lado, ultrapassar sempre que possível, ser gentil jamais, buzinar ao menor sinal de hesitação do condutor à frente. Isso vai desde o motorista do caminhão de entrega, que circula por ruas estreitas com um monstro de dezenas de toneladas, fazendo manobras audazes e tirando fininhos indescritíveis dos outros veículos, movido pela pressa que a pressão do trabalho lhe induz, ao magnata com ocarro que vale mais que uma casa, que considera o espaço embaixo e ao redor de seu sagrado carro um feudo móvel que lhe acompanha a qualquer lugar que vá, inclusive em cima da calçada para parar ou estacionar, e que considera o restante da humanidade como um conjunto de incômodos que atrasam seu caminho, do outro lado do vidro escuro. Nesse ambiente hostil, de banalização da velocidade, intolerância ao erro, tensão contínua e risco real e palpável, andar de bicicleta é aventura reservada aos teimosos de nervos fortes, e seria até irresponsável, uma tragédia anunciada, esperar que as pessoas resolvam comprar suas bicicletas, colocar um buquê de flores no cestinho, e sair por aí alegremente evitando o efeito estufa, contribuindo para sua saúde e ocupando o espaço de um carro a menos. A solução do problema, nesse caso, é incerta, mas certamente envolveria transformar esses comportamentos homicidas em formas garantidas de se envolver em problemas sérios com a lei, como multas cavalares, suspensão do direito de dirigir, e prestação de serviços comunitários.

5) Um dos principais problemas a ser resolvido em Porto Alegre é a falta de lugar onde deixar a bicicleta. Segundo este ponto de vista, apresentado pelo Pablo e apoiado por mim e por outros colegas, pouco ou nada adiantaria semear uma ampla malha de ciclovias pela cidade inteira, se ao chegar ao destino a pessoa não tivesse onde deixar sua bicicleta. Muitos locais de trabalho não têm local para que a bicicleta possa ser guardada durante o expediente, as lojas que têm bicicletários só permitem estacionamento de bicicletas para clientes enquanto estiverem na loja, além de geralmente não possuirem vigia permanente, e os estacionamentos particulares hoje em dia querem ver as bicicletas longe, considerando-as como incomodação certa, seja por ocuparem espaço, serem alvo potencial de furtos, ou danificarem a lataria/pintura de carros estacionados. Diversos estudantes, incluindo o Pablo e eu, estaciona(ra)m as bicicletas do lado de fora de faculdades que tinham amplo pátio, árvores, corrimãos, e baixa circulação de marginais. Por outro lado, poucos se animariam a deixar uma bicicleta a tarde inteira na rua, amarrada a um poste, exposta ao sol, à chuva e aos transeuntes. Concordou-se que, atualmente, o medo e a falta de ciclovias sejam limitantes mais considerados por quem "ainda" não começou a usar a bicicleta, mas fatalmente quem já usa a bicicleta sente essa falta, e quem vier a usar, com ou sem outras infra-estruturas, também vai sentir. Uma solução possível seria construir bicicletários públicos, ou privados, ou coisa que o valha. Uma outra solução interessante, sugerida pelo Pablo, foi criar a obrigatoriedade de que todos os estacionamentos privados de Porto Alegre, ao renovarem seu alvará, tenham de comprovar que disponibilizam um espaço, proporcional ao número de vagas, para o estacionamento de bicicletas, mediante uma tarifa baseada no valor da passagem de ônibus (quanto essa tarifa valeria, como seria calculada, se receberia ou não subsídio do governo, tudo isso seria discutido num segundo momento). A fim de conseguir essa lei aprovada, sugeriu-se elaborar um projeto bem completo, obter 3.000 assinaturas, e entregar algumas cópias para alguns vereadores, de diversos partidos para que não haja comprometimentos maiores, e tentar cavar um lugar, por vias político-legislativas, para uma reivindicação identificada e elaborada pela comunidade ciclística, mediante reflexão e debate prévios.

6) A solução de problemas político-administrativos relativos à inclusão da bicicleta no transporte, em Porto Alegre, já dispõe de canais viáveis, como políticos e secretarias de governo, até mesmo pela própria existência de programas de melhoria do transporte sustentável, como esse do Ministério das Cidades.
Segundo esse ponto de vista, solidamente apresentado pelo Lagartixa, que há anos se reune com prefeitos e secretários de transporte, a faca e o queijo estão aí, mas esbarram na falta de coesão e de consistência por parte da comunidade ciclística, que não comparece a eventos, discussões, votações, passeatas e outras atividades coletivas. Muitos ciclistas acabam ficando acomodados, ou se apegando a convicções ferrenhas e, por discordarem de algum partido, ou de alguma liderança política, ou mesmo de alguma liderança de dentro da comunidade ciclística (moderador de lista, oraganizador de provas, amigo do candidato, os exemplos de fato são infinitos), jamais  conseguem agir em ressonância, reunindo centenas ou milhares de ciclistas em prol de alguma iniciativa, batendo panela na frente da prefeitura e enchendo o saco MESMO das autoridades. A solução dos problemas estaria então na organização e na mobilização conjunta e coordenada de todos os guetos ideológicos, atletas e massa-críticos, downhilleiros e speedeiros, night-bikers e operários-supostamente-picapaus, pula-pulas e tiozões-de-reclinada. Afinal, TODOS, como ciclistas, gostariam de ver realizadas essas melhorias propostas.

A minha contribuição principal (encerrando este longo-texto), diria eu, foi sugerir os seguintes pontos:

a) problemas só são resolvidos quando são identificados corretamente: de nada adiantaria construir ciclovias que levam nada a lugar nenhum, ou que não têm uma largura mínima ou uma visibilidade adequada; de nada adiantaria a educação para o trânsito se o conteúdo ensinado não corresponder ao que realmente vale a pena aprender; em suma, de nada adianta resolver de forma perfeita um problema, se ele for o problema errado;

b) se alguém tem condições de identificar problemas ou soluções para a bicicleta, não são os políticos ou engenheiros (apenas), mas as pessoas que andam de bicicleta (principalmente): já que a demanda por sustentabilidade e eco-amigabilidade está em alta, mas o interesse do governo em frear o modelo de progresso predatório em prol do progresso de qualidade-de-vida-humana (ver Felicidadeinternabruta), não poderia haver melhoroportunidade para que NÓS INTERESSADOS pensássemos, decidíssemos e
disséssemos o que é importante para nós, antes que algum político atrás de uma mesa dê um canetaço nos obrigue a usar espelhos e buzinas, achando que resolveu o problema da circulação de bicicletas (ou construa uma ciclovia de meio metro de largura).

c) se os ciclistas é que têm que decidir como a coisa é, essa decisão só poderá surgir a partir da reflexão e do debate: conforme dito no item A, identificar o problema é fundamental, mas não é fácil. Conforme citado nos itens de 1 a 5, há várias formas de ver o problema, ou os problemas, e visto que todas parecem fazer sentido, seria sensato afirmar que nenhuma delas é "a certa", ou que nenhuma delas é totalmente completa. Como em todos os problemas complexos, a união de visões complementares é a única forma de identificar seus componentes fundamentais, evitando o desperdício de esforços em iniciativas infrutíferas (como seria, a meu ver, tentar inibir o uso do automóvel particular por força de lei).

d) se a reflexão e o debate são necessários, para que eles ocorram de forma efetiva deve haver, em doses iguais, diversidade e respeito à diversidade: se eu pensasse igual ao meu chefe, ele não tinha me contratado (isso é ele mesmo que diz). A diversidade não é um problema, mas a divergência sim, ainda mais quando vira conflito. A experiência comprova que com paciência, tolerância e equilibrando "falar" e "ouvir", todo mundo sai enriquecido e todo mundo fica feliz (às vezes não na hora). De qualquer maneira, por definição, ações "coletivas" e "coordenadas" têm na convergência de diversidades um elemento indispensável.

Felizmente, o que se viu na reunião de quinta foi exatamente isso: tolerância, respeito, moderação (também prudência e ceticismo saudável, quando foi conveniente). A exposição de opiniões foi mais importante do que a imposição de opiniões, e se a coisa continuar nesse rumo, parece que os resultados serão altamente positivos.

Imagina-se que haverá mais reuniões (até porque não faria sentido fazer uma reunião como a de quinta e depois não fazer outras), e ficou pré-combinado que o Pablo Weiss vai elaborar um projeto de lei bem consistente para a questão do espaço para bicicletas nos estacionamentos particulares de Porto Alegre, para que seja depois discutido, formalizado e encaminhado aos N vereadores dispostos a colaborar com a iniciativa.

Gostaria de agradecer ao Sgarbossa pela idéia e pela ação, a todos os colegas que participaram presencialmente (conhecidos ou não), e aos que tiveram paciência de ler toda esta mensagem.

Até mais

Helton